Obs: Artigo originalmente publicado na Reje, Revista Jus Expert, disponível em https://matamba.ao/ao/livraria
1. Introdução
Ponto prévio:
Economia e Direito são gnoses científicas que detêm uma vasta capilaridade interpretativa, das quais, muitas áreas são essenciais para a compreensão e ordenação do comportamento humano, bem como para a melhoria das condições de vida das pessoas.
Segundo PARREIRA L. e BENACCHIO M. (2012), “a Economia pesquisa, como o ser humano a partir de suas escolhas racionais, toma suas decisões e quais são as consequências geradas por elas, na tomada de decisões em um mundo de recursos escassos. O Direito analisa, a conduta dos homens e tende a regular a conduta humana, ou seja " Direito é arte de organizar o comportamento das pessoas" .........
Ao harmonizar estes conceitos (Economia e Direito), é necessário reter que: a partir destes ramos do conhecimento, emergem vários substratos de análise, dos quais a Análise Económica do Direito (AED), que tem o foco ligado, na interpretação e aplicabilidade dos dois pólos do saber.
Os autores PARREIRA L. e BENACCHIO M. (2012) pleitearam que a melhor saída possível, para a crise que o mundo sofre, seria regular, em moldes diferentes a Economia e o Direito.
Porquanto, o modelo económico liberal, causou diversos problemas sociais e ambientais de difícil solução, que exige sábios e engenhosos desenlaces, cuja finalidade pode ser o mundo mais equilibrado.
É possível começar a pensar em soluções concretas de melhoria. Buscando um caminho, em fontes alternativas e diversificadas, tais como a Análise Jurídica da Economia e muito mais, mecanismos para a concretização deste desiderato.
A proposta dos mencionados autores (PARREIRA L. e BENACCHIO M., 2012) é uma reflexão de como o Direito e a Economia por intermédio de uma visão multidisciplinar, podem ajudar a edificar uma justiça mais inclusiva e solidária. Esta deve ser entendida, como aquela, onde a média da qualidade vida dos seus cidadãos, seja constantemente melhorada.
Daí o nosso especial interesse em entender, qual o enquadramento conceptual que se pode atribuir a estes substratos, dentro de uma visão mais holística, como elemento de aferição na aplicabilidade do direito e da economia.
Que objectivos alcançar com este tema?
Objectivo geral:
Partindo do ponto de vista que, para o desenvolvimento humano, é imperioso cumprir com a edificação do bem-estar do homem, concretizando a auto-sustentabilidade, economistas como, AMARTYA SEN E BERNARDO KLIKSBERG, dois grandes defensores da economia solidária, apontam caminhos para a superação das injustiças sociais, sempre privilegiando uma mirada inovadora e humanista, apud NEURO JOSÉ ZAMBAM(1); HENRIQUE ANICETO KUJAWA(2) “ver o desenvolvimento a partir das liberdades substantivas das pessoas tem implicações muito abrangentes para nossa compreensão do processo de desenvolvimento e também para nossos meios de promovê-lo” (SEN, 2000, p. 49).
Ora, seguindo o raciocínio de PARREIRA L. e BENACCHIO M. (2012), que direccionam a Economia numa linha de maior preocupação para com o bem-estar das pessoas, há que passar por demonstrar o quanto a desigualdade e a ausência de liberdade é prejudicial, ao desenvolvimento pessoal do individuo, ao mesmo tempo que frea o crescimento de uma sociedade.
Objectivo específico do trabalho:
Contemplar o papel do Direito e da Economia, em conjunto e em separado, identificar o que cada uma traz, para o mundo da ciência. Este papel as transforma em referenciais de avaliação que se complementam, tornando-as numa chave de balanço valorativo do exercício político.
Portanto, são ferramentas indispensáveis de asseveração governativa e, como tal, devem ser tidas em linha de conta, quando pensamos em estudar o desempenho do Estado, como fiel depositário das garantias constitucionais, para criar o bem-estar dos cidadãos.
Daí, que:
a) Estes insignes, foram a fonte inspiradora que ajudou a traçar o percurso de análise, deste projecto. Pois é curial que estas questões, por serem muitas vezes subentendidas, conscientemente omitidas, mereçam o devido reconhecimento. Elas são de extrema importância para a avaliação daqueles que revestidos de poder, fazem ou não, o seu trabalho.
b) Fui atraído para estes assuntos para despertar e aduzir assuntos, muitas vezes vistos de forma superficial e sob um ponto de vista vago, sem o devido rigor que afinal exigem...
2. Evolução histórica e epistemológica
Na década de sessenta do século passado, houve a partir das entranhas do Direito o movimento de Análise Económica do Direito.
A linha de raciocínio e compreensão, iniciada nos Estados Unidos, foi concebida para estudar e sobretudo analisar a aplicação do Direito em conformidade aos ditames de racionalidade e eficiência da Economia.
A versão original desta corrente de pensamento científico dissertava sobre o que, comummente, se refere à aplicação de métodos económicos – da microeconomia em especial – à questões jurídicas.
Nesse sentido, dentro de uma perspectiva objectiva das duas disciplinas, a Análise Económica do Direito é o emprego dos instrumentais teóricos e empíricos económicos e ciências afins, para expandir a compreensão e o alcance do direito, aperfeiçoando o desenvolvimento, a aplicação e a avaliação de normas jurídicas, principalmente com relação às suas consequências.
Os trabalhos académicos sobre AED se fundamentaram, maioritariamente, em várias frentes como sejam: as tradições do pensamento económico neoclássico e neo-institucionalista, no pensamento marxistas e das teorias críticas da Escola de Frankfurt.
Houve também uma abordagem não neoclássica da Análise Económica do Direito denominada Continental, que se identificou com a Escola Historicista alemã de Economia. É importante ressaltar que, por conta da superposição dos sistemas jurídicos e políticos, algumas das questões, são levantadas pela política económica, Ciência Política, Sociologia, Psicologia ou mesmo Neurologia[1].
Na actualidade, em função das mudanças de contexto operadas desde os anos 70/80 do séc. XX para frente, por qualquer ângulo que se observem os instrumentos Económicos aplicados ao Direito, encontramos formas novas de resolução ou prevenção dos conflitos.
Estas soluções se esmeram por direccionar as acções dos indivíduos, que em acções de retro criticas, atingir o objectivo previsto no ordenamento jurídico de cada país, lutar por uma justiça e equidade social formalizada.
3. Estrutura e campo de análise da AED
Na componente estrutural a AED é composta de duas versões difundidas e que são conhecidas como Positiva ou Descritiva e Normativa ou Prescritiva.
A Teoria Económica Positiva que é representativa da Escola de Chicago e tem como mais significativo integrante Richard Posner.......
E a dimensão da AED conhecida como Normativa ou Prescritiva que apresenta críticas para mudar a realidade, isto é, apresenta-se como guardiã das ideias de como o mundo deveria ser.
Observando de que forma, as noções de justiça interagem, com os conceitos de eficiência económica, maximização da riqueza e do bem-estar, e outros.
E é, exactamente neste ponto que, se centrará nosso foco, nesta síntese!
4. Desigualdade económico-social, que será?
O Direito e a Economia desenvolveram ferramentas interdisciplinares sofisticadas nas últimas décadas, que resultaram em disciplinas mais soltas. Vimos mudar a perspectiva do Direito olhar para o ser humano como um simples objecto jurídico, muitas vezes coisificado e poucas vezes humanizado.
Do mesmo modo, vimos modificada a visão da Economia que trata o ser humano como mera estatística, como um número, e congregar valores quantificados pelo dinheiro.
A expansão horizontal dos direitos humanos nas relações privadas, a inserção dos conceitos éticos no mercado, a intervenção económica do Estado demonstram muitos avanços alcançados. São, todos estes elementos, elucidativos da mudança que se opera no modus vivendi actual.
Nestes termos, a Análise Económica do Direito e a sua parte inversa, a Análise Jurídica da Economia, têm por encargo, mediar possíveis conflitos de grandeza económica e jurídicos, para de forma sustentada, legitimar a evolução e concretização dos direitos económicos, sociais-políticos e humanos.
Mas, por exiguidade de tempo e espaço, não serão devidamente esmiuçados ao pormenor.
5. Sociedades contemporâneas e a justiça - o papel da AED no contexto actual de transformação do mundo
Nas sociedades contemporâneas a Justiça se dirige para a solução de conflitos distributivos decorrentes das interacções sociais no mercado. No fundo, o âmago da questão fica entre seguinte deve-se considerar o direito justo ou injusto?
O grande busílis da questão, fica entre dois pólos, por um lado, o mercado como grandeza económica, que nunca será um elemento de processamento directo da justiça, ao mesmo tempo, o conceito económico de propriedade, por ser mutável e determinante nos procedimentos económico, (tributação distribuição etc), pode e tem influenciar na concretização da justiça.
Somente sustentabilidade em acepção multidimensional permitirá o acesso de todos, aos bens materiais e imateriais necessários, consignados em qualquer carta magna de um país, como direitos fundamentais, mas quando não implementados, tornam-se falhas jurídicas graves.
Para (CUNHA, BRUNO) a exclusão social, e a pobreza a ela associada, decorrem de uma má relação entre a sociedade e o Estado. Este tem a obrigação de respeitar os direitos fundamentais e de tomar medidas para os concretizar, quer através de leis, quer nos domínios administrativos e judicial.
Estão obrigados a respeitá-las tanto as entidades privadas, quanto as públicas e tanto os indivíduos, quanto as pessoas colectivas.
O que tem que ficar patente é que todos os direitos e garantias fundamentais são directa e imediatamente vinculantes e representam imperativos formais de carater obrigatório.
Bem vista a realidade, o Estado de forma consciente ou não, desempenha cristalinamente um papel importante na existência da desigualdade, seja ela económica, social ou política.
Por isso antes de tudo, devemos entender, como surgem a pobreza e o subdesenvolvimento por via da omissão dos direitos fundamentais!
Desde há muito tempo que, a questão básica que ajuíza a pobreza ou o atraso económico não é vista como uma questão jurídica ou política, mas sim explicada por referências históricas, sociológicas e até há quem, vá buscar conforto divino, para legitimar as diferenças económicas.
No fundo, nunca é o sentido mais líquido, que é, de entre outros motivos, a denegação de direitos legalmente constituídos.
Perceber a insustentabilidade e as desigualdades sócio económicas, através de alguma imperfeição jurídica, principalmente pela falha na aplicação de postulados jurídicos...constitucionalmente consagrados. É o cerne da questão.
A POSTERGAÇÃO de muitos destes postulados, cria fossos jurídicos desguarnecidos que, consagram divisórias e castas sociais, bem diferenciadas, umas com oportunidades e outras nem tanto. E, isso acontece porque é ostensivo o assoberbamento das elites políticas, que governam sob o efeito de uma embriaguez qualificada entre o moderado e o exagerado que as tornam insensíveis.
Elas submetem-se, somente ao escrutínio eleitoral, não têm com que se preocupar, salvo em alguns casos, a outros questionamentos, como a responsabilização pela omissão jurídica!
6. Conclusão
Então, enquanto haver divisão e estratificação da sociedade ...por obra e graça da AED podemos começar a desconstruir, certas inverdades e trazer alguma, disrupção nos paradigmas jurídicos políticos e económicos.
A pobreza não é castigo, nem a desigualdade social, oportunidades desaproveitadas, mas sim processos intencionalmente erguidos com fins marcadamente inconfessos e conscientemente assumidos. Elas brotam de propósitos bem definidos.
Somos de opinião que, para além de limitações próprias, dos sistema jurídico e do exercício da aplicação da economia, nos sistemas políticos devem existir, mecanismos de controle fortes e eficazes que impeçam o maniqueísmo das populações, a troco de ideias que nunca vão se concretizar ..sonhos onde que prometem, já sabem que não serão possíveis, alcançar mas nem com isso, se coíbem de prometer, o sentimento de impunidade e de descaso, insiste em estar mais forte do que legado racional dos seres humanos....
Logo podemos inventariar os logros e as conquistas sobre a desigualdade e denegação de direitos ao utilizar a análise económica do direito, como métrica valorativa a partir da qual se possa medir quantitativamente o quanto usufruímos quer da equidade jurídica, quer da justiça económica, na procura do desenvolvimento,
Ao mesmo tempo, pode ser um indicador que faz a avaliação de desempenho da função económica do estado e quanto estas duas variáveis, são concretizadas e estão ao serviço do bem-estar das sociedades.
7. Recomendação
- Em guisa de recomendação, se atendermos ao contexto actual e aos desafios futuros, podemos falar sem medo de errar, que A AED será muito mais profícua se for concebida uma métrica de apreciação da integridade socioeconómico do individuo e da sociedade do que mera ferramenta de afilamento jurídica, talvez a eficácia do controle da gestão política da sociedade, seja mais efectiva se tiver como metodologia a valorização da análise económica do direito e analise jurídica da economia
- Deste ponto de vista, recomendo que se torne mais um recurso, a disposição dos filtros de controle institucional para que, de facto, possa existir um equilíbrio e balanceamento das medidas a tomar e dos objectivos a alcançar, pois no mundo de hoje, a demagogia política se confunde, com arrojo e competência, quando na verdade não passa de mera retórica, sem a devida fundamentação sociopolítica que se deve ter, em conta.
- Por fim, acho que abrimos a análise e discussão de um ângulo diferente a questões como desigualdades sociais, pobreza, equidade, equilíbrio institucional ou "check and balance" controle e filtros da sociedade, para se ter, a percepção que, nem tudo que parece é, e nem tudo que, não assoma, não existe.
- É necessário de vez em quando, escarafunchar o fundo das questões para melhor entender e perceber que houve e haverá, factores subjectivos e objectivos, possuidores de um potencial que, impedem ou facilitam inúmeras decisões, caberá somente o HOMEM, ser aquele que em última instância, deve decidir ...e aqui, a sua capacidade intelectual e grau de maturidade, de entrega, de patriotismo e determinação, serão os principais coadjuvantes, na tomada de posição.
8. Fontes bibliográficas
- Da Análise Económica Do Direito Para A Análise Jurídica Da Economia: A Concretização Da Sustentabilidade The Law And Economics For The Legal Analysis Of The Economy: The Concretion Of The Sustainability ;Liziane Parreira,Marcelo Benacchio
- "A Concretização Da Sustentabilidade" - Redalyc! Prisma Jur., São Paulo, V. 11, N. 1, P. 179-206, Jan./Jun. 2012 181 PARREIRA, L.; BENACCHIO, M;
- Relatório De Desenvolvimento Humano Das Nações Unidas Para O Desenvolvimento, 2011: No Capitulo Sobre "Sustentabilidade E Equidade:
- O Direito À Proteção Contra A Pobreza E A Exclusão Social (2002) Arzabe,Patrícia Helena Massa......DIREITOS HUMANOS(PROTEÇÃO); MARGINALIDADE; SOCIAL POBREZA; PROBLEMAS SOCIAIS; DESIGUALDADE DE RENDA
- Regulação e desenvolvimento econômico: uma análise crítica e interdisciplinar em direito e economia; BRUNO QUEIROZ CUNHA
- Desigualdade Na Renda, Mais Desigualdade No Direito FRANCISCO PETROS
- A aplicação da análise econômica ao direito la aplicación del análisis económico del derecho Barbara Bedin
- Prisma Jurídico ISSN: 1677-4760 prismajuridico@uninove.br Universidade Nove de Julho Brasil..
- https://seer.imed.edu.br/index.php/revistadedireito/article/view As políticas públicas em Amartya Sen: condição de agente e liberdade social........Neuro José Zambam(1); Henrique Aniceto Kujawa(2)
- https://pt.wikipedia.org/wiki/An%C3%A1lise_econ%C3%B4mica_do_direito..., hora de consulta 06.59 do dia 20/09/2021.
- The Global Risks Report 2018 3th edition
- Pesquisa Global sobre Crises 2019
- Perspectives on Inequality and Opportunity from the Survey of Consumer Finances.
- The Market Isn't Bullish for Everyone.
- Discurso State of the Union 2014, Barack Obama
- Teubner, Gunther/Febbrajo, Alberto (1992). "State, Law and Economy as Autopoietic Systems: Regulation and autonomy in new perspective".
[1] Consultar https://pt.wikipedia.org/wiki/An%C3%A1lise_econ%C3%B4mica_do_direito, acessado às 06 horas e 59 minutos do dia 20/09/2021.
Obrigado pela leitura.
Saiba mais sobre esse tema e outros na ReJE, Revista Jus Expert, disponível gratuitamente em https://matamba.ao/ao/livraria.